Como colocar em pratica de arte de amar?
Como se poderá aprender uma arte senão através da prática?
Na vida não se encontra instruções sobre como ser amado.
Amar é uma experiência pessoal que cada um tem de viver individualmente. São poucas as pessoas que não tenham passado por esta experiência (crianças, adolescentes e adultos).
Se analisarmos a prática do amor, permitirmos-à discutir a arte de amar, as formas de a abordar e de a pôr em pratica.
A prática de uma arte tem certos pré-requisitos, exige a disciplina.
Podia-se pensar que não há nada que o Homem moderno aprenda mais facilmente do que a disciplina. Ela passa oito horas por dia a trabalhar de forma disciplinada num emprego rotineiro. Mas, na verdade, o homem moderno tem muito pouca disciplina fora da esfera do trabalho.
Quando não esta a trabalhar, gosta de ser preguiçoso, quer descansar. Esta vontade de descansar é uma reacção contra a rotina da vida quotidiana.
O problema do homem moderno foi que começou a desconfiar da disciplina. Sem disciplina a vida torna-se fragmentada e caótica, sem qualquer concentração.
Concentração é a condição necessária para a execução de uma arte. Esta virtude é cada vez mais rara. É mais rara que a disciplina. A nossa cultura produz um modo de vida desconcentrado. Esta falta de concentração é evidente na nossa capacidade de suportar a solidão. Estar quieto, sem falar nem fumar, nem beber, nem ler é para muitos imposs´vel. Há uma necessidade de ocupar as mãos e a boca.
Qualquer pessoa que tenha tentado aprender uma arte sabe que a paciência é necessária para se produzir resultados. Quem quiser obter resultados rápidos nunca aprendera uma arte.
Para o homem moderno, a paciência é tão difícil de conseguir quanto a disciplina e a concentração. Todo o nosso mundo industrial se baseia no oposto: a rapidez. Todas as máquinas são concebidas para a velocidade.
Não se começa a aprender uma arte de forma directa, mas antes de uma forma indirecta. Começa-se por aprender uma grande quantidade de coisas, antes de se aprender a arte propriamente dita. Por exemplo um aprendiz de carpinteiro começa por aplainar madeira; um estudante de piano começa por fazer escalas, etc.
Quem se quiser tornar um mestre em qualquer arte deve dedicar-lhe poda a sua vida; ou, pelo menos fazer dessa arte um ponto fulcral (central) da sua vida.
Qualquer pessoa que queira ser um mestre na arte de amar deve começar por praticar a disciplina, a concentração e a paciência ao longo de toda a sua vida.
Como é que se pode praticar a disciplina?
Para os nossos avós, a disciplina, consistia em levantar-se cedo, trabalhar arduamente e não viver uma vida demasiado luxuosa. Levantar-se a uma hora razoável, dedicar algum tempo à meditação, à leitura, à música, a exercícios moderados, não comer nem beber de mais.
È essencial que a disciplina não seja praticada como uma regra imposta do esterior, mas que se torne uma expressão da nossa própria vontade.
É triste que o conceito de disciplina seja entendida como uma coisa desagradável e que só “faz bem” por ser desagradável. No oriente reconhece-se que aquilo que é bom para o ser humano, também tem de ser agradável.
A concentração é a virtude mais difícil de praticar na nossa cultura, onde tudo parece conspirar contra a capacidade de concentração. Um dos passos mais importantes para aprender é saber estar sozinho. Na verdade, concentrar-se significa ser capaz de estar sozinho consigo mesmo.
Parece paradoxal, mas, a capacidade de estar sozinho permite que se tinha a capacidade de amar.
No que diz respeito à nossa relação com os outros, estar concentrado significa sobretudo ouvir. A maior parte das pessoas ouve os outros e chega mesmo a dar conselhos sem estar realmente a ouvir.
Qualquer actividade que seja feita com concentração desperta-nos. Concentra-se significa viver intensamente o presente, o aqui e agora, sem pensar na próxima coisa a fazer enquanto estou a fazer outra.
A concentração também deve ser praticada. Ele exige por vezes a paciência. Um exemplo vivo da experiência é de uma criança, que quando começa a andar, vai caindo, caindo até aprender a andar sem cair.
Não se pode aprender a concentração sem cultivar a sensibilidade de si. O que é que significa? O exemplo disto é a reacção e sensibilidade de uma mãe em relação ao seu filho que encontramos o exemplo mais óbvio. A mãe nota certas mudanças, pedidos e ansiedade s mesmo antes de estes serem expressos abertamente.
Isso significa que ela está sensível às manifestações da vida da criança; ela não está ansiosa nem preocupada, mas num estado de equilíbrio e de alerta.
Qualidades específicas necessárias para amar.
A principal condição para se atingir o amor é a capacidade de ultrapassar o narcisismo. A personalidade narcísica só considera real aquilo que existe em si; os fenómenos do mundo exterior não têm qualquer realidade em si, mas são vistos apenas como sendo úteis ou perigosos para o eu.
O pólo oposto ao do narcisismo é o da objectividade. Todos nós temos uma visão subjectiva do mundo, distorcido pela nossa tendência narcísica.
A razão é aquilo que nos permite pensar de forma objectiva e a atitude emocional subjacente à razão é a humildade. Ser objectivo e racional só é possível a quem tenha uma atitude humilde e tenha abandonado os sonhos infantis de omnisciência e omnipotência.
No que diz respeito à arte de amar, isto significa que o amor implica o desenvolvimento da humildade, da objectividade e da razão.
A humildade e a objectividade são indivisíveis, tal como o amor.
Se quero aprender a arte de amar, devo tentar ser objectivo em qualquer situação e reparar naqueles casos em que não consigo sê-lo.
Ser capaz de ser objectivo e racional é meio caminho andado para aprender a amar.
A capacidade de amar depende da capacidade de ultrapassar o narcisismo; depende da nossa capacidade de crescer, de desenvolver uma orientação produtiva na nossa relação com o mundo e connosco mesmos. Este processo de libertação pressupõe a fé.
O que é a Fé?
Temos que distinguir a fé racional da fé irracional. A fé irracional, consiste numa crença, em algo ou em alguém que se baseia na submissão a uma autoridade irracional. A fé racional é uma crença que está enraizada na nossa experiência do pensamento e do afecto, uma questão de ter certezas e convicções firmes. A fé é uma característica da personalidade na sua totalidade, mais do que uma crença específica.
Na esfera das relações humanas, a fé é uma qualidade indispensável para qualquer amizade importante ou para qualquer relação amorosa.
“Ter fé” noutra pessoa significa ter a certeza que as suas atitudes fundamentais a sua personalidade e o seu amor são fiáveis e inevitáveis; que pode mudar de opinião, mas que as suas convicções de base serão as mesmas.
Só quem têm fé em si mesmo é capaz de ser fiel aos outros. A fé em si mesmo é o que permite que se tenha a capacidade de fazer promessas.Ter fé, significa acreditar também nas competências dos outros. A fé nos outros tem o seu ponto alto na fé na humanidade.
A fé irracional tem por base a submissão a um poder que é sentido como sendo imensamente forte e na renúncia do poder e da força de cada um. A fé racional baseia-se na experiência contrária, resulta da experiência e do pensamento de cada um.
Ter fé requer coragem, a capacidade de correr riscos e de aceitar a dor e a desilusão.
Amar e ser amado requer coragem, a coragem de acreditar em certos valores, de arriscar e apostar tudo nesses valores.
A prática da fé e da coragem começa com os pequenos pormenores da vida quotidiana.
Amar significa comprometer-se sem garantias, entregar-se completamente, na esperança de que o nosso amor faça com que a pessoa amada nos ame também. O amor é um acto de fé e quem tem pouca fé também tem pouco amor.
A actividade é uma atitude indispensável para a prática da arte de amar.
“O amor é uma actividade; se eu amar, estarei num estado constante de preocupação activa com a pessoa amada. Eu serei incapaz de me relacionar activamente com a pessoa amada se for preguiçoso”.
“A arte de amar está inevitavelmente relacionada com o domínio social. Se amar significa ter uma atitude de amor em relação a todos, se o amor é uma característica da personalidade, então ele deve existir não só na nossa relação com a família e os amigos, mas também com os nossos colegas de trabalho”.
“Chega-se a Conclusão que falar de amor hoje em dia, é participar de uma grande fraude; diz-se que, neste mundo, só um mártir ou um louco pode amar e que por isso, a discussão sobre o amor é apenas uma falsa moralização”.
“Quem for capaz de amar, hoje em dia, é necessariamente uma excepção à regra; o amor é, necessariamente, um fenómeno marginal na sociedade ocidental contemporânea. E não é por estarmos demasiado ocupados que não temos uma atitude de amor pelo próximo”.